Chegamos ao Instituto Moreira Sales (IMS) e dezenas de pessoas já lotavam a primeira das várias salas que abrigam a exposição do fotógrafo malinês. Ouviam atentamente as informações compartilhadas por Samuel Titan Jr. e Jacques Leenhardt, curadores da mostra. Uma ou outra fazia perguntas - “Que máquina usava?“, “E a luz?”, “Qual o filme?”, “Quantas poses?”. Todos olhavam encantados as fotografias de Seydou Keïta.
Keïta nasceu em 1921, em Bamako, Mali. Era o mais velho em uma família de cinco filhos. Começou a vida como carpinteiro, o mesmo ofício de seu pai. Desenvolveu interesse pela fotografia quando ganhou de seu tio uma Kodak Brownie com filme de oito poses.
“Comecei a fotografar, em 1945, em Bamako, sozinho, sem saber nada, com uma câmera 6 x 9 que o meu tio havia me trazido do Senegal. Também tinha me dado dinheiro para comprar filme. Foi assim que aconteceu. Sinceramente, é um ofício que tentei fazer o melhor possível, gostei tanto da fotografia. A princípio fotografei a família. E aí, algumas poses davam, outras não. De fato, comecei mal: as pessoas se mexiam, eu também devia tremer um bocadinho.”
Seydou Keïta aprendeu fotografia e como desenvolvê-la com Pierre Garnier, um francês dono de uma loja de suprimentos fotográficos, e com Mountaga Traoré, seu mentor.
Logo desenvolveu uma estética própria: luz natural, tecidos de fundo com estampas típicas da África Ocidental contrastando com as vestimentas locais tradicionais e modelos cuidadosamente posicionados. O pequeno estúdio, no quintal de terra batida, no centro da capital malinesa, tornou-se famoso. Todos queriam ser fotografados por Keïta. Em quase quinze anos foram mais de 30 mil retratos da população local e de visitantes de países fronteiriços.
“Em 1948, quando Mountaga soube que eu já tinha conhecimentos, passou-me o laboratório. Revelava nessa altura só em preto e branco. Já havia fotografia colorida, mas era preciso mandar para a França. De qualquer maneira, não me interessava nada. Para mim, o preto e branco é que era bonito.”
No ano seguinte, Keïta comprou uma câmera maior e começou a usar negativos 13 x 18. Segundo ele, nessa época, “a cultura dos antepassados começava a desaparecer” e as pessoas da cidade passaram a vestir-se sob influência francesa. Entretanto, nem todos podiam se vestir assim, então, o fotógrafo tinha, em seu estúdio, três ternos europeus diferentes, com gravata, camisa, sapatos e chapéu, canetas, flores de plástico, aparelhos de rádio, telefone, à disposição de seus clientes.
“São elementos que remetem à modernidade e até ao próprio mundo colonizador, mas que, longe de representarem sinais de submissão, são parte de um processo de afirmação de si, explicou Samuel Titan Jr.
Dos milhares de cliques feitos ao longo da vida, Keïta conservou todos os negativos, o que tornou possível a redescoberta global de seu trabalho no início da década de 1990. “Eles são memórias do que fiz durante a vida, porque sei que aqui (na África) tudo vai se transformar”. Museus, galerias, críticos e nós, o público, logo nos vemos seduzidos pelas elegantes imagens capturadas de um jeito único por Keïta. Graças a elas, podemos conhecer pais e filhos, casais, irmãs, homens e mulheres, representantes de uma sociedade em transição, vivendo a tradição e experimentando a modernidade, assumindo vestes, poses e posturas, diante e atrás da câmera.
Poster anuncia a exposição, na entrada do IMS Rio |
Onde e quando visitar?
O IMS Rio apresenta, em 130 fotografias, um recorte da extensa produção de Seydou Keïta, realizada entre os anos de 1948 e 1962.
Em cartaz até 27 de janeiro de 2019.
Visitação de terça a domingo e feriados (exceto segunda-feira), das 11h às 20h. Entrada gratuita.
O IMS fica na Rua Marquês de São Vicente, 476 - Gávea.
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