O Acadêmico eleito e cineasta Carlos Diegues encerrou o ciclo de conferências do mês de setembro da Academia Brasileira de Letras (ABL), no último dia 27, no Teatro R. Magalhães Jr. Sob a coordenação do Acadêmico e poeta Geraldo Carneiro, o tema da palestra de Cacá foi “Letras e Imagem: a literatura no cinema”. Diegues foi eleito para a Cadeira 7 da ABL, no dia 30 de agosto deste ano, sucedendo o Acadêmico e cineasta Nelson Pereira dos Santos, precursor do Cinema Novo, falecido em 21 de abril, aos 89 anos.
Carlos José Fontes Diegues nasceu aos 19 dias do mês de maio de 1940, em Maceió. Sua família mudou-se para o Rio de Janeiro quando ele tinha 6 anos. Foram morar no bairro de Botafogo, onde Cacá passou toda sua infância e adolescência. Cursou Direito na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), onde, presidente do Diretório Estudantil, fundou um cineclube, iniciando suas atividades como cineasta amador na companhia de Arnaldo Jabor e David Neves, entre outros. Dirigiu o jornal “O Metropolitano”, da União Metropolitana de Estudantes (UME) e fez parte do Centro Popular de Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE). No final da década de 1950, os grupos do cineclube da PUC e de “O Metropolitano” se tornaram um dos núcleos de fundação do “Cinema Novo”, do qual Cacá Diegues é um dos líderes, juntamente com Glauber Rocha, Leon Hirszman, Paulo César Saraceni e Joaquim Pedro de Andrade. Esta nova geração de cineastas buscava registrar a verdadeira imagem do Brasil: “Os cineastas brasileiros levaram suas câmeras e saíram para as ruas, o país e as praias em busca do povo brasileiro, o camponês, o trabalhador, o pescador, o morador das favelas”. A máxima “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça” colocava em segundo plano os obstáculos causados pela falta de recursos técnicos e financeiros. Movidos pela paixão pelo cinema, os cinemanovistas o utilizavam para explicar, de forma crítica, questões sociais e humanas, fazendo uso de uma linguagem inspirada em traços de nossa própria cultura. Bem humorado, Diegues disse que o Cinema Novo tinha três objetivos: “mudar a história do cinema, mudar a história do Brasil, mudar a história do mundo”.
Após realizar alguns curtas-metragens, Cacá Diegues estreou profissionalmente dirigindo um dos episódios de “Cinco Vezes Favela”, filme considerado uma das obras fundamentais para o advento do Cinema Novo no Brasil.
Foram mais de 20 longas-metragens realizados ao longo de sua carreira. Entre eles estão “Ganga Zumba” (1964), “Os herdeiros” (1969), “Joanna Francesa” (1973), “Xica da Silva” (1976), “Chuvas de verão” (1978), “Bye Bye Brasil” (1980), “Quilombo” (1984), “Um trem para as estrelas” (1987), “Tieta do Agreste” (1995), “Orfeu” (1999), “Deus é brasileiro” (2003), “O maior amor do mundo” (2005) e, o mais recente, “O grande circo místico” (2018), que está na disputa por uma indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Aliás, esta é a sétima vez que um filme de Cacá Diegues é selecionado pela Academia Brasileira de Cinema para concorrer ao Oscar. E por falar em premiações, todos os filmes de Diegues foram lançados comercialmente em vários países do mundo, indicados e/ou premiados nos mais importantes festivais. Todo esse reconhecimento é muito importante não apenas para Diegues, mas também para o país e sua produção cinematográfica. Entretanto, para nosso mestre do cinema há algo ainda mais valioso: “Nada disso, Oscar, Cannes, Veneza, Toronto... nada disso é o juiz supremo do cinema brasileiro. O juiz supremo do cinema brasileiro é o público brasileiro, é o público para o qual você fez o filme.”
Durante sua palestra na ABL, Diegues falou sobre seus filmes que tiveram inspiração na literatura: “Ganga Zumba” (baseado no livro homônimo de João Felício dos Santos); “Joanna Francesa” (inspirado em vários livros, dentre eles, “Riacho Doce”, de José Lins do Rego, “Angústia” e “São Bernardo”, de Graciliano Ramos, e “Cem Anos de Solidão”, de Gabriel Garcia Márquez); “Xica da Silva” (não foi inspirado por um livro e sim pelo desfile dos Acadêmicos do Salgueiro, mas inspirou um livro); “Tieta do Agreste” (adaptação, em parceria com João Ubaldo Ribeiro, do livro de Jorge Amado); “Orfeu” (baseado na peça “Orfeu da Conceição”, que marcou a sua vida); “Deus é brasileiro” ( baseado no conto homônimo de João Ubaldo Ribeiro, com quem escreveu o roteiro); e “O Grande Circo Místico” (inspirado no poema de Jorge de Lima).
Sobre o tema “Letras e Imagem”, Cacá Diegues ainda explicou que
“Tem certas coisas que a palavra é mais importante que a imagem. Tem certos autores que você não consegue filmar, por exemplo, (Marcel) Proust, que os melhores cineastas do mundo já tentaram filmar, mas nunca conseguiram um bom filme. James Joyce, então, nem se fala. No Brasil, tem Machado de Assis, que até hoje não deu um grande filme, porque tem coisas que a palavra fica grávida de ideias que a imagem não pode ter a mesma força. Mas tem coisas que a imagem tem mais força que a palavra.”
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